O que são aquelas ligações que desligam na sua cara???
A busca de eficiência dos call centers pode ser um pouco irritante.
O celular toca, você atende e não tem ninguém do outro lado da linha. Pouco depois, outra ligação. Mesmo número, ninguém ali. Passa mais um tempo, toca outra vez. Número novo, mesmo problema. Quando toca pela quarta vez em poucas horas, você, sem muita paciência, atende e enfim ouve uma voz. É alguém que lhe oferece um produto ou, pior, cobra uma dívida antiga.
É bem provável que você já tenha vivido esta situação. Antes de ser dominado pela raiva, talvez você tenha se perguntado por que, antes da venda ou da cobrança, ocorrem tais ligações-fantasmas. Afinal, por que desligam em nossas caras? O que fazemos de tão ruim para merecer tamanha grosseria?
A resposta, caso sirva para lhe deixar menos irritado, é até simples: tratam-se de falhas dos discadores automáticos das “campanhas ativas” dos call centers, isto é, quando eles ligam para vender algo ou cobrar um cliente.
Os discadores começaram a ser adotados no Brasil na segunda metade dos anos 1990, mas foi a partir de 2010 que se tornaram mais frequentes graças à popularização de tecnologias como o VoIP (Voice over Internet Protocol), que permite que ligações telefônicas sejam feitas por meio da internet, e a telefonia móvel com o GSM (Global System for Mobile Communications), conforme explicou Fábio Santana, diretor de negócios da Teclan Engenharia de Software, empresa de tecnologia para call centers.
O sistema utilizado nos discadores telefona automaticamente para os contatos de um mailing pré-estabelecido. Uma vez que o cliente atende, a máquina transfere a ligação para um atendente que esteja livre. O problema é que nem sempre é o cliente que atende do outro lado da linha. “A chamada pode cair em uma caixa postal ou ser atendida por uma gravação, por exemplo”, comentou Santana.
Para contornar esta situação, os aparelhos ligam para várias pessoas de uma só vez e é aí que os problemas acontecem. Uma quantidade grande de chamadas é feita para que um grupo pequeno de operadores atenda. Assim, provavelmente algum dos clientes vai ter uma ligação desligada na cara. “A questão toda está relacionada à produtividade do call center e dos operadores, de forma a trazer chamadas boas para estes agentes”, diz Santana.
Segundo o diretor de negócios, existe uma dificuldade em detectar quais chamadas são de fato “boas”. Estes sistemas podem levar alguns segundos para identificar se uma ligação é válida ou não. No processo, ao detectar o “padrão de fala”, podem errar e entender que uma pessoa falando é, na verdade, uma gravação e assim desligar. “Nos últimos três anos a falta de padronização das caixas postais se tornou uma complicação e tem exigido uma tecnologia mais avançada nesta detecção”, comentou.
Santana ainda observa que, na tentativa de deixar a coisa um pouco mais eficiente — e menos desagradável —, existem algoritmos para discadores que trabalham de formas mais inteligente do que jogar um grande número de ligações para um atendente. Dentre essas, uma das mais avançadas é a da discagem preditiva, que cruza informações coletadas durante os atendimentos, a exemplo do tempo médio de conversação e taxa de abandono. Assim, faz simulações que ajudam a prever com mais acerto quando o operador estará livre, reduzindo o número de ligações.
Apesar do desenvolvimento de técnicas mais avançadas, algoritmos mais agressivos e menos eficientes ainda são bastante populares nos discadores utilizados no Brasil. Um dos principais produtos oferecidos no mercado nacional é o Power Dialing, também conhecido como Over Dialing. Aparelhos com sistemas deste tipo ligam para o maior número possível de pessoas no mailing na tentativa de que os atendentes tenham o menor tempo ocioso possível. Eles possuem taxas altíssimas de discagem e simplesmente correm atrás de conseguir um cliente, sem muita qualidade nas ligações.”
Isso, claro, acaba gerando uma altíssima “taxa de abandono” — número de ligações desligadas em relação ao número de ligações feitas. Segundo Santana, muitos sistemas que fazem uso deste algoritmo não exibem a percentagem das ligações abandonadas, já que os valores são realmente altos. “Diferente do que acontece em alguns países onde este limite é claramente definido, no Brasil não existe regulamentação quanto a isso”, comentou Santana destacando que nos Estados Unidos, por exemplo, a taxa de abandono máxima permitida é de 3%.
Uma vez que não existe uma regulamentação, são as empresas que ficam encarregadas de definir qual é seu ritmo e quantas ligações podem ser abandonadas pelo sistema. Apesar do quadro, Santana é otimista em relação ao mercado. Para ele algumas empresas estão começando a entender que, se o cliente for muito incomodado, ele vai preferir fazer negócio com outro.