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Baccalà alla vicentina !!!

Portugal é o país que mais consome bacalhau – são 70 mil toneladas por ano, o equivalente a 7 kg anuais por habitante. Mas a receita mais preparada atualmente no mundo com esse saboroso peixe desidratado foi criada na Itália. É o baccalà alla vicentina.

Polvilhado com farinha de trigo, temperado com salsinha e anchova, cozido na panela com queijo ralado e pimenta, vai à mesa ao lado da polenta.

Como o nome sugere, originou-se em Vicenza, na região do Vêneto e Friúli. A população da cidade informa que ele divide com o genial arquiteto Andrea Palladio (1508-1580) o posto de símbolo local. A difusão do prato vem sendo feita pela Venerabile Confraternità del Baccalà alla Vicentina, criada em 1987 para protegê-lo das reproduções desfiguradoras. Os bons restaurantes de cozinha italiana de todos os continentes o oferecem no cardápio – daí, talvez, sua crescente popularidade.

A receita tradicional manda elaborá-lo com stoccafisso, stocco ou merluzo seccato, peixe desidratado ao ar livre, o mesmo processo do bacalhau, porém sem adição de sal. Os italianos o conhecem desde o século 15, quando o barco do mercador veneziano Pietro Querini, repleto de vinho, especiarias, perfumes e sedas, bateu em uma rocha da costa da Noruega. Sobrevivendo ao acidente, ele conseguiu chegar às Ilhas de Lofoten com um quinto dos seus 57 marinheiros. O acidente aconteceu em 1432.

Mas foi o Concílio de Trento, convocado pelo papa Paulo III em 1545 para enfrentar a Reforma Protestante, que consolidou sua aceitação. Uma das diretrizes da grande assembleia católica era reforçar a importância espiritual da abstinência de carne e do jejum em vários dias do ano. Na Itália e demais países católicos, impôs-se desse modo o consumo do stoccafisso e do bacalhau. Teria nascido nessa época a receita vicentina.

Estranhamente, ela não é mencionada nos cardápios dos banquetes renascentistas. O gastrônomo e escritor Pellegrino Artusi (1820-1911), que codificou a cozinha regional italiana no livro La Scienza in Cucina e l’Arte di Mangiar Bene, também não a citou. A Venerabile Confraternità acredita que a omissão se deveu ao fato de se tratar de receita “vulgar”. No início, realmente o stoccafisso e o bacalhau foram alimentos dos pobres.