Comandante Niltinho

Comandante Niltinho: O hangar e a pista do fim do mundo !!! – Final

 Cmt. Niltinho e ajudante, abastecendo o CZC no Hangar em Tucumã!
 
Bom, vocês devem estar imaginando que o dificil eu já tinha feito, que era convencer o senhor Darci a dar-me uns voos, mas, doce engano, o que estava pela frente, se soubesse jamais teria aceitado, simplesmente porque eu iria por a minha vida em risco varias ocasiões, além de arriscar o meu avião, que era o mais importante e a vida dos meus passageiros.
 
E como havia dito, eu não tinha condições de fazer aqueles vôos, eu não estava preparado para voar com 500 quilos de carga fora meu peso (70 quilos) e mais algumas besteirinhas que não tinha jeito de evitar!
 
Decolava-se com quase 600 quilos, muito acima dos 360 recomendados pelo manual da aeronave, vejam só que loucura!
 
Porém, a sorte estava lançada, só me restava fazer tudo certinho, caso contrário o bicho ia pegar.
 
O dia amanheceu meio nublado, calculei que teríamos chuvas esparsas pela tarde, e não deu outra, fui para o aeroporto munido de GPS, já configurado com os parâmetros da pista do Fim do Mundo, fazer meu primeiro vôo.
 
Quando cheguei, lá estava o senhor Pé de Cobra me aguardando, com dois passageiros e, de resto, uma carga tão variada que me assustou: de gasolina a gêneros alimentícios, ferramentas, que tive que ir empilhando dentro do avião, procurando dar um jeitinho para sobrar um espaço para meus dois passageiros.
 

Com a carga pronta, só me restava decolar, e era justamente isto  que eu não tinha pressa de fazer!
 
Naquele momento, Pé de Cobra encarou-me e disse:
“- Na volta quero que você faça uma perna (novo trecho), passe na fazenda da Perach, pegue umas mercadorias que andaram deixando por lá e leve para a pista do Fim do Mundo. E vá com Deus Niltinho!”
 
Era isto mesmo que eu iria precisar, e muito! A decolagem era sempre tranqüila naquela enorme pista de Tucumã, mais de mil metros ladeira abaixo sem obstáculos e não tinha santo que não ajudasse o avião sair do chão!
 
Mais uns minutos e já estávamos cruzando por cima da serra da Mutuquinha e quem diria que ali está guardada a segunda maior concentração de níquel do mundo, que será explorada pela Vale, mediante um projeto que irá mudar a vida de Tucumã e Ourilandia para sempre!
 
Passávamos por ali todos os dias e nem desconfiávamos da presença desta mina. Se soubéssemos, teríamos comprado as terras do entorno e hoje estaríamos ricos mas, fazer o quê, não é?
 
O tempo de vôo era de mais ou menos de quarenta minutos, e após alguns minutos, voando sobre algumas fazendas, cruzei a pista do garimpo da Liberdade, e, dali para a frente, meu amigo, só tinha a fazenda da Perach e nada mais!
 
Quando faltava uns cinco minutos para a pista eu olhava para frente tentando enxergar algum sinal de abertura da pista e nada, só avistava mata!
 
Quando deu dois minutos a mesma coisa! Um minuto nada! Pensei comigo: aqueles sacanas deram-me as coordenadas erradas, só para me sacanear! E agora?
 
Quando o GPS zerou e olhei para baixo levei o maior susto da minha vida, pois, o que vi, nada tinha de pista: era só uma pequena abertura, a qual jurava não caber o avião, a não ser que as asas ficassem para trás@
 
No segundo seguinte, já tinha perdido a pista, e aí fui entender porque aquilo se chamava de pista do Fim do Mundo!
 
Tratei de manobrar para que o GPS me levasse novamente para cima da pista, e, nisto, meus passageiros também perceberam e me perguntaram:
 
“ – Comandante, você vai pousar aí?
“ –Vou! É o jeito, fiquem calmos!”
 
Naquele momento só pensava no negócio que havia feito, uma grande tacada daquelas, para não dar em nada?
 
Nem pensava em desistir, aquilo se tornou uma questão de vida ou morte, e naquele momento comecei a conversar comigo mesmo, e porque não, com Deus! Não sabia se seria justo estar apelando para Deus, para resolver minhas loucuras!
 
E agora senhor Niltinho? Pensei! Trate de dar seu jeito e ponha logo este avião no chão, falei para comigo mesmo!
 
Aquele negócio eu não iria perder, mesmo que me custasse a vida, e foi assim que acalmei-me,  baixando a adrenalina e fui para o pouso!
 
Não sei se vocês sabem, mas no garimpo, e em pistas semelhantes, você nem pensa em arremetida, pois após o avião flapeado, reduzido e perdendo altura, não tem chance de escapar da lenha, portanto, se perceber que não vai dar, saia do pouso enquanto tem tempo!
 
Acho que foi isto que faltou na decisão do piloto no caso do acidente da TAM em congonhas.
 
Quando já estava no limite e não enxergava a pista, o que me restou? Arremeter e preparar para nova tentativa e foi assim por duas vezes seguidas, e com isto vocês nem imaginem como, estavam meus passageiros: morrendo de medo e suplicando pelo amor de Deus que eu abandonasse o pouso e voltasse para Tucumã, porém isto nem passava pela minha cabeça! Era tudo ou nada!
 
Nas tentativas que fiz, havia reparado que existiam duas arvores bem diferentes, uma castanheira que era bem alta e a outra eu não recordo o nome porém se destacava muito bem das demais, bem no  que deveria ser o eixo da pista.
 
Imaginei eu, se passando a primeira e avistando a segunda, poderia reduzir o motor, dar o flap e começar a descida que, certamente, iria avistar a pista na minha frente.
 
Só que, se a descida fosse incorreta, não teria mais chance de abortar o pouso, e acabaria me esborrachando no chão, exatamente como aconteceu com o Cmt. Chambari em Roraima.
 
Não tive escolha, vim novamente para pouso, só que desta vez com a determinação de acabar logo com aquilo, passei pela primeira arvore pela segunda e ainda não avistava nada, continuei descendo, descendo, quando avistei um buraco no meio das arvores e tratei logo de encaixar o avião bem no meio e acho que naquele momento eu fechei os olhos, pois tinha a impressão que não ia caber e eu acabaria batendo as pontas das asas nas arvores.
 
Só que deu certo! Que alegria quando senti as rodas deslizando! Parei no final da pista, desci do avião e fui acalmar a tremedeira das pernas!
 
Acho que demorei um bom tempo para encarar o retorno. Nisto, já estava pousando também o Cmt.Rochinha, e tive que empurrar meu avião para dentro do mato, para dar espaço para seu pouso, para descarregar sua aeronave e decolar novamente, abrindo, novamente, caminho para a minha decolagem, logo em seguida.
 
 
Tive vontade de agradecer-lhe pelas coordenadas tão bem tiradas, que muito me ajudaram. A decolagem foi mamão com açúcar, mas  sai ralando a barriga do avião nas castanheiras, e isto porque saí sozinho, sem passageiros ou carga,  e isto deu mais força para aquele velho motor que já estava precisando de uns anéis novos, o mínimo que eu poderia fazer por ele, naquele momento! Estava no maior blefo (sem dinheiro!) da minha vida e endividado até o pescoço com senhor Darci!
 
Já na minha decolagem, vi que o tempo havia mudado e já tínhamos chuvas esparsas na área e aquilo me tirou da idéia de fazer a perna na fazenda Perach. Imaginem vocês se iria entrar naquele túnel de novo com chuva no para-brisas?
 
Fui embora passando por cima da fazenda Perach, deixando para trás a bendita perna (parada), só que quando chequei em Tucumã o senhor Pé de Cobra quase me bateu por causa disto! Tive que explicar que a forte chuva impediu-me de lá pousar, o que ele acatou!
 
Só que senti que se não cumprisse mais as ordens dele, logo estaria fora do esquema, pois era quem ali mandava, sem dúvida nenhuma!
 
Fui tomar uma cerveja para relaxar, no bar de umas quengas dentro do aeroporto, e não é que vejo o Pé de cobra vindo em minha direção e pensei logo: Meu Deus, acho que não vou aquentar esta pressão por muito tempo!
 
“ – Niltinho sabe oque aconteceu com o Edilaine?” Perguntou-me. – “ “- Não, respondi.”
“ – Fui informado pelo radio, que ele acabou de quebrar no pouso, o avião do Gilmarzinho, logo após você ter decolado!”
“ – Meu Deus e como ele está?”
“ – Está bem. Só que vou ter que mandar limpar aquela pista direito, senão o próximo vai ser “alguém” e olhou-me, sorrateiro.
 
“ – Seu Pé de Cobra, eu sei porque ele bateu. Deve ter entrado para pouso com chuva no para-brisas e naquela pista, piloto com boa visão já passa raspando as arvores, imagine sem enxergar direito?
 
E além do mais, não sou mais jovem, e jovem gosta de aventura e eu não estou nessa mais. E aí vem o moral da historia: nem sempre o piloto que é um ás, é o melhor piloto para o dono do avião, não é mesmo, Gilmarzinho?
 
E os vôos continuaram e eu pagando a divida com senhor Darci, até que um dia ela zerou, e aí logo estava eu novamente na sua frente pedindo mais vôo, e não é que acabei comprando a minha primeira casinha, em troca de vôo também, por três mil reais?
 
Quando estava me preparando para negociar aqueles lotes de terras na cidade, acabei batendo em um bezerro numa decolagem na pista da fazenda Brasud, quebrando a cauda do CZC e perdendo boa parte da safra de mogno, acabando aí, minha história com a Perach!
 
Comandante Niltinho
é piloto de garimpo

 

8 comentários sobre “Comandante Niltinho: O hangar e a pista do fim do mundo !!! – Final

  • Fidencio: Peço-lhe que entre em contato com o taiadablog, através do email taiadablog@gmail.com pois o Comandante Niltinho respondeu seu comentário, ok? jcflores

  • nasci em tucumã em 1986..conheço tucumã muito bem..voei muito como BADECO,. inclusive do meu pai..QUE VOAVA o PT-BHA. Tentei ser piloto., mas caminhos diferentes trilharam minha vida. Hoje sou analista de sistemas,. e estudo para ingressar na Receita Federal do Brasil.

  • Olá Niltinho, te conheço bastante, eu era SECRETA em tucumã,. voei contigo no CZC,. vinhamos de uma fazenda não me lembro o NOME. Trabalhei, com GILMAR.., estudei para tirar o PP..mas não deu certo, ficava caro d++,.na época., o PINGO me deu os materiais dele.,que ele estudou para BREVETAR..,enfim,. formei em ANALISE DE SISTEMAS,.trabalho já mais de 10 anos com TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO,. moro em Goiás desde 2004. Fui inúmeras vezes no garimpo do ARRAI2 em cima da SERRA no PT-BHA flap MANUAL..na pista da LIBERDADE,.com NELSINHO.., e fui BADECO na safra da SEMENTE..e JOGUEI racho na CLAREIRA..também, tudo com intuito de PILOTAR um dia..MAS não deu CERTO. Atualmente to estudando para ingressar na AUDITORIA DA RECEITA FEDERAL.

  • ola comandante Niltinho muito legal suas historias!morei em Tucuma de 92 a 95 estou tentando recordar mais nao nao me lembro do CZC!nessa epoca ele ja estava em Tucuma?ficava em que local do aeroporto ali?me lembro como hoje tinha ali o Vanderlei o angar do Rochinha, do Bosquinho me lembro do 206 da peraque!mais a baixo ficava alguns outros avioes!se nao me engando do PE de cobra,e depois o angar do Silvio finote mais o Pereira!me lembro de vc tambem por la.belas hitorias do CZC….

  • “Anonimo”os treis continuam por aqui, Rochinha é um rico fazendeiro, gilmar tem o melhor super mercado de Tucumã,Pereira tem o maior taxi-aéreo da região,10 avioes, em sinte-se aproveitaram o dinheiro ganhado nos garimpos de Tucumã.

  • que loucura em!moro em goiania mais ja trabalhei no aeroporto de tucuma como secretario com varios!vc sabe noticias do rochinha do gilmasinho do pereira se ainda estao em tucama?abracao…..

  • Jurandir, e quem diz que seguradora faz seguro para avioes que voam em pista que não são homologadas? Niltinho piloto

  • E como é que fica o seguro dos aviões, quando são carregados com peso acima do limite?

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