Seu filho ajuda em casa???
Até alguns anos atrás era comum que os filhos ajudassem seus pais nos afazeres domésticos. Mesmo em casas nas quais nunca faltou empregada, pedia-se que arrumassem suas camas ou que mantivessem alguma ordem na sala ou nos quartos. Nos finais de semana, quando a arrumadeira descansava, as crianças auxiliavam lavando alguma louça depois do café da manhã ou do almoço e, para aqueles que gostavam, era dada a oportunidade de ajudar na preparação da refeição do meio-dia.
Tudo isso era normal e totalmente aceitável. Não era encarado pelos filhos como castigo ou punição. Se prestarmos atenção ao fato poderemos perceber que, inclusive, ainda que de forma inconsciente, acabava se tornando parte natural da formação daquelas crianças de outrora.
Não retorno a esta situação e contexto com o olhar saudosista que muitos podem pensar está orientando estas linhas. Penso no quanto esta situação constitui elemento formativo, ou seja, no seu caráter pedagógico, ainda que não tenha sido pensado desta forma. Cortar a grama, lavar o carro ou arrumar a mesa para uma refeição constituem ações que permitem a estas crianças e adolescentes compreender a necessidade da cooperação, do trabalho em equipe, da solidariedade que começa na família e se estende a sociedade, aos mais necessitados.
Por incrível que pareça, ao proporcionarmos estas ações cotidianas do trabalho doméstico as novas gerações, também ensinamos a iniciativa para, por exemplo, que manuseiem ferramentas e instrumentos domésticos (há adolescentes hoje que têm dificuldade para, por exemplo, utilizar um abridor de latas e que acabam se tornando os adultos de amanhã que nem sabem trocar uma lâmpada ou consertar pequenos defeitos que surgem em sua casa).
Esta situação de cooperação dos filhos com o trabalho doméstico, ainda que ocasional ou pontual, num país onde as empregadas até algum tempo atrás eram mais comuns na realidade dos lares, quadro que está em processo de mudança no Brasil deste século XXI, em virtude da maior escolarização das novas gerações, do custo elevado desta mão de obra, da menor disponibilidade de domésticas no mercado, entre outros fatores, dá a eles maior senso de que fazem parte de um grupo e que, para a satisfação de todos e harmonia do lar, há uma certa normalidade que precisa ser respeitada, uma ordem a ser mantida.
A transferência desta consciência coletiva, aprendida dia após dia, semana após semana, vai se corporificando e deixa de ser algo que repercute apenas na família, no âmbito doméstico. Ultrapassa estas fronteiras e atinge os demais espaços por onde esta pessoa passa ou irá passar, como a escola, o clube, a igreja, o trabalho quando se integrar ao mercado…
Não se pode, é claro, abusar da situação. A participação deve ser estimulada, pedida ou até mesmo cobrada em alguns casos, mas o sentido de atuação deve ser sempre explicado como parte da convivência coletiva, da necessidade que temos de ajudarmos uns aos outros, da convivência, dos valores humanos relacionados a fraternidade e a solidariedade.
Os pais não devem sentar-se na sala, à frente da TV, e transformar seus filhos em serviçais a atender suas necessidades. As crianças só entenderão e participarão se perceberem que a articulação envolve o esforço de todos, de pais e filhos.
Além disso, a distribuição de funções, delegando responsabilidades deve ser compatível com as faixas etárias, legando sempre trabalhos mais fáceis e tranquilos para os menores e para os mais velhos, aos poucos, adicionando graus mais elevados de responsabilidade nestes afazeres domésticos.
Uma grande dúvida que persiste é se este auxílio prestado pelos filhos deve ser de alguma forma recompensado financeiramente. Há famílias que relacionam ações como lavar o carro, cortar a grama ou levar o lixo para fora da casa a mesadas ou semanadas. Pessoalmente sou contra, pois não gosto da ideia de que a atuação dos filhos tenha que ser motivada por dinheiro, de forma direta ou indireta, pagando-se por isso em dinheiro ou com presentes e mimos.
É questão das mais polêmicas neste caso, mas creio que é preciso estreitar os laços e o relacionamento familiar a partir da compreensão de que independentemente do dinheiro o que nos une é o amor, o carinho, a presença, os laços sanguíneos. Não estou com isso me posicionando contra as mesadas ou afins, mas contra a ideia de que elas tenham que estar atreladas a ajuda em casa, em afazeres domésticos. Seu filho ou filha não podem e nem devem se sentir como um empregado remunerado. Esta ajuda deve ser resultado do respeito, consideração e sentimentos puros e genuínos que os unem aos pais.
Para finalizar, não devemos nos esquecer, é claro, que tudo isso deve ser pontual, natural e espontâneo, parte de uma dinâmica de vida familiar compreendida e aceita por todos. Destaco que a responsabilidade maior de nossas crianças e adolescentes é o estudo!
João Luís de Almeida Machado
Membro da Academia Caçapavense de Letras