A Cobra Fumou: a verdade sobre a expressão mais emblemática da 2ª Guerra Mundial!!!
Muito se falou a respeito da origem da expressão “A COBRA FUMOU”; “A COBRA VAI FUMAR”; “A COBRA ESTÁ FUMANDO” mas a definição que está prevalecendo e que aparece em alguns livros que eu tive a oportunidade de ler é, de que um General em uma das reuniões que decidiam a criação de uma força militar brasileira para participar na 2ª Guerra Mundial, teria dito: “É mais fácil uma cobra fumar do que uma força militar brasileira participar do conflito mundial”. Essa afirmação, sem significado algum, além de não ter qualquer base de sustentação é ainda, desprovida de qualquer princípio de relacionamento histórico, para que possa ter credibilidade suficiente a fim de que essa tese seja aceita, por terem sido feitas por pessoas alheias a história e, talvez nem tivessem nascido na época em que o fato ocorreu. Não obstante, ela é a que está prevalecendo.
Essas expressões “a cobra fumou, vai fumar ou está fumando” são mais antigas do que a FEB. Ela foi o fruto de um fenômeno local que aconteceu na Cidade de São Paulo. Esse fenômeno isoladamente era insignificante e, teria se perdido na história se não fora um outro acontecimento. Este sim, muito importante que foi a decisão da criação da Força Expedicionária Brasileira. Esses dois acontecimentos se encaixaram perfeitamente e se fundiram de tal forma que lhes deu a condição capaz de projetar essas “EXPRESSÕES” para sempre no “CENÁRIO” do maior feito da História Militar Brasileira.
HISTÓRICO
Na Cidade de São Paulo, na época, os camelôs eram vendedores ambulantes que circulando pela cidade, ofereciam os seus produtos nas casas e principalmente nos bares da cidade. Eram proibidos ficarem parados. No fim da década de 1930 e no início da década de 1940 surgiram várias vendedores de outros estados, quase todos de Goiás e Mato Grosso. Eles apareceram em grupos de 3 ou 4 pessoas, todos levando uma “MALA” enorme e, se instalavam na Praça da Sé, Praça da República e outros locais onde havia grande fluxo de pessoas. Em determinado momento um deles abria a “MALA” e exibia uma enorme cobra jibóia.
Naquela época, a mais de 60 anos atrás, esse tipo de réptil era uma atração fantástica para o povo da Cidade de São Paulo e, logo um número enorme de pessoas se aglomerava em torno da cobra. Um deles enfiava um tubinho, usado nas tecelagens para enrolar fios, na boca da jibóia com um cigarro apagado e com um isqueiro, fingindo que acendia o cigarro, gesticulava e falava daqui a pouco a cobra vai fumar, criando aquela expectativa inédita para o povo paulistano. Em seguida os outros personagens abriam as outras malas e ofereciam os seus produtos: remédio para calo, perfume, produtos para o cabelo e outras quinquilharias.
Como esse procedimento era proibido, surgiam os fiscais da Prefeitura e naquele momento os personagens fechavam as malas rapidamente e saiam correndo para lados diferentes, cada um levando a sua “MALA”. Até aqui não há novidade nenhuma, esses fatos acontecem até nos nossos dias. Eis que na mesma época surgiu a grande notícia que comoveu todos os brasileiros. Ficou resolvido que o nosso país iria participar ativamente da 2ª Guerra Mundial, mandando uma força militar para combater nos campos de batalha da Itália. Esse contingente foi denominado “Força Expedicionária Brasileira” e que o primeiro escalão partisse do Estado de São Paulo. A partir daí a Cidade de São Paulo viveu um alvoroço, as convocações começaram a ser feitas e aqueles que eram convocados se apresentavam no Quartel do Parque Dom Pedro II, todos vindo do interior e de outros Estados.
Obviamente, todos sem exceção traziam a sua “MALA” a fim de transportar roupas e seus objetos de uso pessoal. Inclusive os oficiais convocados tinham o mesmo procedimento. O nosso campo de treinamento principal era no Parque Dom Pedro II em torno do quartel e na várzea do Glicério. Como naquela época ninguém tinha carro, os convocados desciam do bonde na Avenida Rangel Pestana e outros na frente do próprio quartel. De cada bonde que parava, descia uma leva de convocados todos trazendo a sua “MALA”. Nós que estávamos recebendo e dando instrução no parque, todos gritávamos repetidamente “OLHA A COBRA” a “COBRA VAI FUMAR”, era uma gritaria infernal. Eles ficavam todos assustados olhando ao seu redor, uma vez que não sabiam qual a razão daquela algazarra.
“NA HORA DO ALMOÇO”
Os militares almoçavam antes e após o almoço, até recomeçarem as instruções, ficávamos todos no pátio do quartel. A formação dos convocados era em coluna de três, deixando os seus pertences de lado para irem almoçar. Na volta todos iam procurar escova de dente ou uma toalha para a sua higiene bucal e obviamente tocavam nas “MALAS”. Ao fazerem esses gestos, “JÁ ESPERADOS POR TODOS”, era o suficiente para desencadear aquele coro infernal, provocando uma gritaria que ecoava por todos os recantos do pátio do quartel: “OLHA A COBRA” a “COBRA VAI FUMAR”. Esses acontecimentos se repetiam todos os dias durante o período das convocações.
“OUTRO ACONTECIMENTO DIGNO DE NOTA QUE PROVA O QUE ESTÁ SENDO AFIRMADO” é de que a expressão “A COBRA FUMOU” é mais antiga do que a FEB. No início, estavam sendo feitas apenas as convocações, depois os incorporados eram encaminhados ao 6º Regimento de Infantaria, sediado na cidade de Caçapava, unidade determinada para ser o 1º Escalão da Força Expedicionária Brasileira para lutar nos campos de batalha da Itália. Os convocados, após os exames de rotina eram incorporados e recebiam o fardamento, começando a receber as instruções diárias, duras e cansativas que iniciavam as 7 horas da manhã. Depois de um dia estafante, em razão das instruções recebidas, o soldado retornando ao quartel tomava banho, jantava e sem dinheiro, só havia um lugar para se divertir, principalmente para aqueles que não eram nativos da Cidade de São Paulo. A diversão era pegar um bonde (grátis) e se dirigir a zona do meretrício.
Os militares só tinham acesso livre nesse local em horas determinadas. Das 19:00 ás 22:00 horas. Nesse período, o fluxo de militares na zona do meretrício era tão grande que houve a necessidade de ser criada uma patrulha militar. Eu era Sargento e comandei essa patrulha várias vezes. Todas as noites havia conflitos e muitas vezes violentos. Os jovens soldados se apaixonavam pelas prostitutas e vice versa. Enciumados, insistiam em permanecer nos quartos após as 22:00 horas.
As cafetinas reclamavam, considerando que elas só começavam a faturar depois das 22:00 horas, quando os soldados se retirassem. Nesse momento o choque era inevitável e, havia a necessidade da patrulha usar da força física para tirar o militar do recinto, prendendo-o. Esse procedimento se desenrolava durante todas as noites. Quando saia o boletim anunciando a escala de serviço para o dia seguinte, aqueles que eram designados para a Patrulha da Zona do Meretrício, comentavam: “AMANHÃ A COBRA VAI FUMAR”.
Eu fiz questão de citar esse fato, para ficar comprovado que a expressão “COBRA FUMOU” é mais antiga do que a Força Expedicionária Brasileira, uma vez que, nessa ocasião, nós ainda não havíamos sido incorporados a ela.
A COBRA FUMOU = significado = o fato já aconteceu.
A COBRA VAI FUMAR = significado = o fato vai acontecer.
A COBRA ESTÁ FUMANDO = significado = o fato está acontecendo.
Essa é a historia verdadeira da criação dessas expressões, cujo relato é baseado em fatos concretos acontecidos na Cidade de São Paulo = Berço da Força Expedicionária Brasileira. Não adianta ser Ex-Combatente de qualquer patente, de Soldado a General, ter servido em outros escalões nos outros estados. Esses fatos, só sabem aqueles que na época serviram no Exército na Cidade de São Paulo. Foi um fenômeno local que separadamente não tinha significado algum, como
já foi dito, mas num determinado momento, coincidentemente se amoldaram e se fundiram criando essas expressões que ficaram eternamente registradas no maior feito da História Militar Brasileira.
O povo brasileiro é imbatível e um observador emérito daquilo que acontece no cotidiano, transformando tudo que vê em versos. No caso ele assimilou a “MALA” que foi a vedete dessa história, considerando que foi o objeto que todos os Ex-Combatentes usavam. A ”COBRA”, o perigo iminente que uma Guerra, pode ocasionar e o desfecho lamentável e desastroso do final de uma batalha, seja qual for o resultado. Dessa mescla diversificada surgiu o slogan, o símbolo, o marco inicial que posteriormente se transformou no “BRASÃO” que identificou a Força Expedicionária Brasileira.
A VERDADE NARRADA POR AQUELE QUE VIVEU A HISTÓRIA
o 1º Sgt FEB Newton La Scaleia, do 6º Regimento de Infantaria de Caçapava,SP, partiu para a Itália no Primeiro Escalão, retornando à pátria, são e salvo. Foi companheiro do editor do taiadaweb, na diretoria da Associação dos Ex-combatentes da FEB de São Paulo, vindo a falecer em Jan de 2016, aos 94 anos de idade. È pai de nossa amiga e entusiasta da FEB Meyre La Scaleia, com quem tivemos o prazer da convivência, nos anos de FEB SP.
Quanto aos fatos acima citados, o Sgt FEB La Scaleia enviou ao então Cmt do Comando Militar do Sudeste, Gen Ex Esper, em 2009, uma carta solicitando a formação de uma comissão para avaliar todo o assunto e reparar definitivamente, eventuais equívocos quanto à expressão citada, carta esta que obteve a resposta do general, informando que o assunto estaria sendo encaminhado ao Projeto História Oral – 2ª Guerra Mundial, na Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural do Exército. Cobrou, do Gen Ex João Carlos Vilela Morgero, então Cmt do CMS, a resposta à solicitação citada. Lamentou, em carta ao Gen Ex Adhemar da Costa Machado Filho, então Cmt do CMS, a desconsideração, por parte da Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural do Exército em examinar todas as particularidades que envolvem o assunto, cuja única finalidade é a de identificar, preservar e perpetuar um símbolo nascido no decorrer de um dos maiores acontecimentos da História Militar Brasileira! Infelizmente, esse pedido foi desconsiderado e ignorado, até o presente momento!